Por José Manoel Ferreira Gonçalves
engenheiro, advogado e jornalista
A Autoridade Portuária de Santos (APS) planeja conceder, ainda em 2025, a operação da Usina Hidrelétrica de Itatinga, em Bertioga. O projeto promete modernizar a geração de energia, ampliar o potencial turístico da Vila de Itatinga e implantar um parque de hidrogênio verde voltado à descarbonização do Porto de Santos.
Patrimônio centenário em transformação
Inaugurada em 1910, a usina é considerada um marco da engenharia nacional. Hoje gera cerca de 15 MW, mas os estudos apontam possibilidade de expansão para até 29 MW, com troca de turbinas e melhorias na linha de transmissão.
Além da modernização energética, a concessão inclui a revitalização da vila histórica, acessível apenas por lancha pelo Canal de Bertioga, que poderá se tornar destino turístico de destaque no litoral paulista.
Licença ambiental inédita
Em 2024, pela primeira vez em mais de um século, a usina obteve Licença de Operação de Regularização da CETESB, com validade de 10 anos. O documento garante segurança jurídica ao processo, mas também impõe condicionantes ambientais que precisarão ser rigorosamente cumpridas: monitoramento de fauna, qualidade da água, controle da erosão e preservação do canal adutor.
Hidrogênio verde no porto
O projeto prevê ainda a criação de um parque de hidrogênio verde (H₂V), tecnologia estratégica para reduzir as emissões ligadas às operações portuárias. Para que o H₂V seja efetivamente sustentável, será necessário atender critérios de adicionalidade – ou seja, garantir que a eletrólise seja alimentada por energia renovável adicional e rastreável.
Turismo e impacto social
A abertura da Vila de Itatinga ao turismo representa oportunidade de valorização cultural e geração de renda. No entanto, é preciso estabelecer limites de visitação, políticas de acessibilidade e programas educativos para evitar impactos negativos.
Outro ponto sensível envolve os pescadores artesanais do Canal de Bertioga, que podem ser afetados pelo aumento do tráfego de embarcações turísticas. O diálogo com essas comunidades deve ser prioridade para prevenir conflitos e garantir inclusão social.
Governança e transparência
Para que a concessão cumpra sua promessa, a governança será decisiva. É fundamental que os estudos de viabilidade sejam divulgados, que o edital de licitação apresente uma matriz de riscos clara e que indicadores ESG sejam contratualizados. Metas como emissões evitadas, acesso social ao turismo, programas de preservação cultural e relatórios anuais de sustentabilidade devem constar no contrato com o futuro concessionário.
Como cidadãos e engenheiros comprometidos com o desenvolvimento sustentável e a transparência na gestão de recursos públicos, entendemos ser nosso dever acompanhar de forma ativa obras e projetos de grande relevância, como a Usina Hidrelétrica de Itatinga. Essa postura fundamenta o pedido de informações protocolado junto à Autoridade Portuária de Santos (APS)¹, amparado pela Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), com o objetivo de garantir que o processo de concessão, a operação e o monitoramento ambiental da usina sejam conduzidos de maneira responsável, pública e auditável.
¹ Pedido nº 00118000389202532, protocolado junto à APS com base na Lei de Acesso à Informação.
Um pacto pelo futuro
Mais do que uma usina, Itatinga é símbolo da história portuária de Santos e da capacidade técnica da engenharia brasileira. A concessão pode transformá-la em referência mundial em inovação sustentável — mas somente se for conduzida com transparência, responsabilidade ambiental e compromisso social.
*José Manoel é pós-doutor em Engenharia, jornalista, escritor e advogado, com uma destacada trajetória na defesa de áreas cruciais como transporte, sustentabilidade, habitação, educação, saúde, assistência social, meio ambiente e segurança pública. Ele é o fundador e presidente da FerroFrente e da Associação Água Viva. Em 2018, fundou e passou a coordenar o Movimento Engenheiros pela Democracia (EPD), criado a partir da convicção de que a engenharia, como base material do desenvolvimento nacional, deve estar a serviço da democracia, da ética e da justiça social.
Declaração das fontes: As informações contidas neste artigo baseiam-se em relatórios e comunicados oficiais da Autoridade Portuária de Santos (APS), publicações institucionais sobre a Usina Hidrelétrica de Itatinga, documentos da CETESB relacionados à licença ambiental, registros históricos da usina e matérias jornalísticas de veículos de referência, sem inclusão de links no corpo do texto.