Seria mais prático recriar as capitanias hereditárias

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*José Manoel Ferreira Gonçalves

Um país estagnado, que se exime de um projeto nacional de desenvolvimento e prefere entregar de bandeja o patrimônio público para a iniciativa privada. Esse é o retrato do Brasil sob as rédeas de Bolsonaro e seus ministros, incapazes de adotar uma visão de longo prazo para promover avanços na economia.

Mais um exemplo dessa estreita e imediatista gestão é a propalada privatização do porto de Santos, o mais importante da América Latina, com o anúncio da Antaq, Agência Nacional de Transportes Aquaviários, de que estará aberta até o dia 16 de março a consulta pública com estudos técnicos e jurídicos sobre o assunto. Após essa etapa, serão emitidas as minutas de edital e contrato, a serem submetidas e avaliadas pelo TCU.

A expectativa do governo federal, desde sempre ansioso por mais essa privatização, é realizar o leilão ainda em 2022, prevendo um período de concessão de 35 anos, com mais cinco prorrogáveis. O plano do governo é vender sua participação no porto e realizar uma concessão para a administração do serviço portuário. Em resumo, vamos vender a soberania sobre o porto. É como deixar de ter controle sobre a Marinha, a autoridade aduaneira.

Estamos falando de um dos mais importantes e estratégicos ativos do país. O porto de Santos foi inaugurado em 1892. Sua área de influência econômica engloba mais de 50% do PIB do Brasil e 49% da produção nacional. Além disso, concentra uma parte significativa do comércio internacional. Declinar do controle desse aparelho portuário é dizer “amém” à falta de protagonismo econômico e político. Seria mais prático recriar as capitanias hereditárias.

Para a Baixada Santista, especificamente, será mais um duro golpe. Há décadas a região vem perdendo sua importância econômica, fruto da apatia política de seus dirigentes. A recuperação do porto exerceria uma influência primordial na recuperação da Baixada. Mas, ao que tudo indica, se a população não reagir, as decisões sobre o futuro do porto ficarão a cargo das empresas que o arrematarem em leilão.

Para completar o grave quadro entreguista, não se sabe ao certo quando haverá audiência pública presencial nos termos da Antaq para o rito de privatização já instalado.

É urgente que o assunto seja amplamente discutido, sem afoiteza, com toda a transparência possível. O debate popular precisa pautar o processo e evitar que o bem comum seja prejudicado (a mesma Antaq quer permitir a instalação de um terminal para movimentação e armazenagem de matérias-primas altamente
explosivas no entorno do porto: mais uma proposta temerária que tramita no âmbito da agência!).

Precisamos de uma agenda econômica sólida para o Brasil e a Baixada Santista. A venda do porto é um erro, que contradiz e invalida qualquer política pública voltada para o desenvolvimento nacional e regional.

Precisamos de um porto vibrante, com o melhor serviço e menor tarifa, sob o controle e incentivo do Estado, que não deveria almejar lucro, mas sim a expansão econômica advinda da competitividade das empresas, com mais emprego e melhores salários.

O Brasil e a Baixada Santista devem ser respeitados. Sua gente merece um futuro melhor.

*José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro e escritor. Presidente da FerroFrente (Frente Nacional pela volta das Ferrovias) e da Associação Guarujá Viva (Aguaviva). Diretor da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU).


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