*Por José Manoel Ferreira Gonçalves
Engenheiro, advogado, jornalista, sócio do Corinthians desde 1982.
Fim do RCE põe finanças em risco
A gestão de Osmar Stabile no Corinthians avalia deixar o Regime Centralizado de Execuções (RCE), uma decisão que, se concretizada, pode representar um retrocesso drástico na organização financeira do clube. O RCE foi adotado em abril deste ano, em meio a um cenário de dívidas que ultrapassam os R$ 2 bilhões, e trouxe uma relativa estabilidade, ao permitir o pagamento de débitos judiciais de forma ordenada e supervisionada.
Abandonar esse sistema, no entanto, elimina a previsibilidade do fluxo de caixa e permite pagar os amigos empresários, em acordos pontuais e sem mediação judicial. A medida, além de arriscada, indica uma guinada preocupante no modelo de governança.
Decisão política ou técnica?
O Regime Centralizado de Execuções (RCE) é previsto na Lei da SAF (Lei nº 14.193/2021), que estabelece esse mecanismo para auxiliar os clubes a reorganizar suas dívidas. Embora tenha sido criado para clubes que aderem ao modelo SAF, sua aplicação tem sido objeto de debates e decisões judiciais, com alguns tribunais permitindo que clubes que não se tornaram SAF também o utilizem.
O RCE centraliza todas as execuções judiciais em um único processo, sob comando do Judiciário. Para o clube, significou a possibilidade de reorganizar suas obrigações, evitar bloqueios surpresa de receitas e recuperar a credibilidade com o mercado. No entanto, a atual diretoria considera que o modelo engessa as finanças e impede negociações diretas com credores.
Essa argumentação, embora tecnicamente válida em parte, abre margem para favorecimentos perigosos. Sem o controle externo do Judiciário, o clube poderá escolher quem pagar primeiro, com que valores e em quais condições. Isso elimina a previsibilidade do fluxo de caixa e permite pagar os amigos empresários, favorecendo acordos obscuros e de difícil auditoria pública..
Relatório da EY permanece em sigilo
A preocupação aumenta com o silêncio em torno do relatório financeiro produzido pela Ernst & Young (EY). Apesar da confirmação oficial de que o clube recebeu o documento, o conteúdo ainda não foi tornado público — contrariando a promessa de “transparência total” feita por Osmar Stabile em campanha.
O receio entre conselheiros e torcedores é que o documento contenha indícios de uso indevido do cartão corporativo por mais dirigentes já afastado por irregularidades. O relatório da EY poderia esclarecer, com dados, como se deu a gestão dos recursos internos, mas sua não divulgação fortalece a percepção de que há algo a esconder.
O risco de um ciclo vicioso
Se confirmada a saída do RCE e mantido o sigilo do relatório financeiro, o Corinthians pode mergulhar novamente em um ciclo vicioso: dívidas impagáveis, acordos de bastidor, perda de receitas recorrentes e fuga de patrocinadores. A transparência, que deveria ser a base de qualquer gestão moderna, está sendo trocada por manobras que favorecem interesses pessoais.
A torcida, maior ativo do clube, exige respostas. O Conselho Deliberativo precisa atuar com firmeza, exigindo explicações claras e acesso ao conteúdo do relatório. É inadmissível que decisões estratégicas de tamanha relevância ocorram sem debate público ou prestação de contas.
O futuro passa pela transparência
Neste momento crítico, o Corinthians precisa mais do que nunca de previsibilidade financeira e segurança institucional. Abandonar o RCE sem um plano transparente e sem apresentar o conteúdo da auditoria da EY é uma manobra temerária, que enfraquece o clube e dá margem para suspeitas legítimas.
O momento exige responsabilidade e compromisso com os valores que moldaram a grandeza do Timão: clareza nas decisões, respeito ao torcedor e ética na gestão.
*José Manoel Ferreira Gonçalves é Engenheiro Civil, Advogado, Jornalista, Cientista Político e Escritor. Pós-doutor em Sustentabilidade e Transportes (Universidade de Lisboa). É fundador e presidente da FerroFrente e da Associação Água Viva, coordenador do Movimento Engenheiros pela Democracia (EPD) é um dos fundadores do Portal de Notícias Os Inconfidentes, comprometido com pluralidade e engajamento comunitário.
Declaração de Fontes: “As informações contidas neste artigo foram obtidas a partir de fontes confiáveis e verificadas: ESPN Brasil, Meu Timão, Relatório da EY (confirmado pela diretoria do Corinthians), entrevistas públicas do presidente Augusto Melo, e análises de especialistas financeiros do esporte.”