Cratera: privatização em colapso

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José Manoel Ferreira Gonçalves
Engenheiro, advogado e jornalista

Um mês depois, o mesmo buraco

A reabertura de uma cratera na Marginal Tietê, em pleno eixo viário de São Paulo, escancara não apenas o solo da maior cidade do país, mas também o abismo de responsabilidade técnica e institucional que a recente privatização da Sabesp parece ter aprofundado. Um mês após o reparo inicial, o mesmo buraco volta a interditar parte vital da via expressa, causando transtornos monumentais ao trânsito e acendendo o alerta sobre a qualidade dos serviços executados sob a nova administração privada.

Ao que tudo indica, a cratera simboliza mais que um problema pontual: ela é o sintoma de um modelo de gestão que promete eficiência, mas entrega improviso. A Sabesp, agora em mãos privadas, deveria representar um salto em “tecnologia avançada inovação”, mas o que se viu foi uma falha reincidente que expôs milhares de motoristas e trabalhadores a risco e caos.

Tecnologia avançada inovação em xeque

A propaganda da privatização da Sabesp vendeu ao público uma ilusão de modernidade e investimentos. Disseram que a tecnologia avançada inovação guiaria os próximos anos da empresa, e que serviços como os de abastecimento, saneamento e infraestrutura subterrânea ganhariam agilidade e precisão. Mas se uma cratera abre duas vezes no mesmo lugar em tão curto espaço de tempo, o que podemos esperar dos serviços menos visíveis?

A obra emergencial reaberta neste 11 de maio não é um evento isolado. Ela é resultado direto de inspeções técnicas malconduzidas, de avaliações estruturais insuficientes e, possivelmente, de economias de escala que priorizam cortes de custo em detrimento da segurança pública. Em outras palavras, é o preço da pressa e do lucro onde deveria haver zelo técnico e responsabilidade social.

O colapso silencioso da engenharia urbana

Segundo especialistas ouvidos pela imprensa, o novo afundamento pode estar ligado à mesma rede de esgoto operada pela Sabesp que cedeu anteriormente. Isso revela que as causas estruturais jamais foram plenamente sanadas. Além disso, a liberação gradual da pista prevista pela empresa pode significar apenas mais uma camada de tinta sobre um problema profundo, negligenciado, e agora reincidente.

Na lógica do setor privado, eficiência se traduz em lucro. Na lógica da engenharia urbana, eficiência se mede em durabilidade, previsibilidade e segurança. Confundir essas métricas é comprometer o futuro das cidades e da população que nelas circula todos os dias. Não se trata de ser contra a privatização por ideologia, mas de cobrar resultados que, até agora, estão longe de aparecer.

Privatização não pode ser desculpa para descaso

Os moradores de São Paulo estão pagando caro — com horas no trânsito, insegurança e medo — por uma transição que deveria trazer modernização e melhorias reais. A cratera da Marginal Tietê é um retrato do que acontece quando se confunde “tecnologia avançada inovação” com marketing e promessa vazia. A gestão privada da Sabesp precisa ser responsabilizada por cada centímetro desse desabamento, pois a cidade não pode ser laboratório de erros para investidores que desconhecem suas raízes.

Enquanto a Sabesp promete, a cidade afunda — literalmente.

*José Manoel é pós-doutor em Engenharia, jornalista, escritor e advogado, com uma destacada trajetória na defesa de áreas cruciais como transporte, sustentabilidade, habitação, educação, saúde, assistência social, meio ambiente e segurança pública. Ele é o fundador da FerroFrente, uma iniciativa que visa promover o transporte ferroviário de passageiros no Brasil, e da Associação Água Viva, que fortalece a participação da sociedade civil nas decisões do município de Guarujá. Membro do Conselho Deliberativo da EngD

Declaração de Fontes:
“As informações contidas neste artigo foram obtidas a partir das reportagens da CNN Brasil, G1 São Paulo (11 e 12 de maio de 2025), e análise técnica da situação com base na experiência profissional do autor.”


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