O Navio Prof. W. Besnard Renasce como Museu

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*Por José Manoel Ferreira Gonçalves
Pré-candidato a prefeito do Guarujá pelo PSol

Um Legado de Descobertas

O Prof. W. Besnard, primeiro navio oceanográfico da Universidade de São Paulo, representa um marco na história da ciência brasileira. Lançado ao mar em agosto de 1966, o navio recebeu seu nome em homenagem ao primeiro diretor do Instituto Oceanográfico da USP, Professor Wladimir Besnard, visionário que lutou pela criação de um navio próprio para a universidade. O Besnard, projeto do Escritório Técnico de Construção Naval da Escola Politécnica da USP, sob a supervisão do Almirante Yapery, iniciou suas operações em agosto de 1967, marcando o início de uma era de descobertas oceanográficas para o Brasil.

Durante seus 23 primeiros anos de serviço, o navio navegou ininterruptamente, acumulando mais de 3.000 dias no mar e centenas de viagens científicas, incluindo seis expedições à Antártica. Sua primeira expedição polar, um marco para a ciência brasileira, consolidou o papel do país na pesquisa antártica. As mais de 150 viagens do Besnard renderam 68 diários de bordo repletos de histórias e cerca de 50 mil amostras de organismos marinhos, algumas delas ainda não catalogadas.

O Fim de uma Era e o Risco de Esquecimento

Em novembro de 2008, um incêndio em um dos camarotes do Besnard, então fundeado na Baía de Guanabara, marcou o fim de sua brilhante carreira. Apesar de controlado pela tripulação sem vítimas, o incidente selou o destino do navio. Abandonado e posteriormente descomissionado em 2016, o Besnard foi transferido para o porto de Santos, onde permaneceu atracado no cais da USP, deteriorando-se gradativamente. A situação precária do navio, que custava R$ 25 mil por mês à universidade, levou o Ibama a alertar para o risco de afundamento.

A USP chegou a oferecer o Besnard ao Uruguai, mas a comissão uruguaia, após analisar as condições do navio, desistiu da oferta devido aos altos custos de restauração. Diante do impasse, duas opções se apresentaram: transformar o Besnard em um museu flutuante ou afundá-lo para criar um recife artificial.

Um Clamor pela Preservação da História

A possibilidade do afundamento do Besnard gerou grande comoção pública, especialmente entre ex-tripulantes, pesquisadores e entusiastas da náutica. A maioria defendia a criação de um museu, reconhecendo a importância histórica do navio para o Brasil. Em 2020, a situação precária do Besnard ganhou destaque na mídia, com jornais e emissoras de TV exibindo imagens da embarcação em estado de abandono. A Santos Port Authority (SPA) e o Ibama realizaram uma vistoria e tiveram que executar uma operação de emergência para evitar o afundamento.

Uma Luta pela Dignidade do Besnard

O advogado e entusiasta da náutica Fernando Liberalli, sensibilizado com a situação do navio, fundou a OSCIP Instituto do Mar com o objetivo de lutar por sua preservação. Liberalli, após visitar o Besnard e constatar que a embarcação não corria risco iminente de afundar, propôs à USP a cessão do navio para a OSCIP, com o intuito de transformá-lo em um museu.

Enquanto buscava apoio para sua iniciativa, Liberalli descobriu que a USP havia doado o Besnard à cidade de Ilhabela, onde seria afundado para a criação de um recife artificial. Indignado, Liberalli acionou o Ministério Público e o Condephaat, buscando o tombamento do navio como Patrimônio Cultural do Estado de São Paulo.

O Reconhecimento e a Mudança de Destino

Em agosto de 2018, o Condephaat iniciou o processo de tombamento do Besnard, reconhecendo sua importância histórica e científica para o Brasil. A decisão do Condephaat levou a prefeitura de Ilhabela a desistir do afundamento do navio, que foi posteriormente doado ao Instituto do Mar.

Com o tombamento assegurado, Liberalli buscou apoio financeiro da CODESP para a reforma do navio. A CODESP, em acordo com o Ministério Público, destinaria R$ 2,5 milhões, provenientes de uma multa ambiental, para a restauração do Besnard. No entanto, a pandemia de COVID-19 obrigou a realocação dos recursos para a área da saúde pública.

Um Novo Lar para o Besnard: O Parque do Valongo

Em 2023, a prefeitura de Santos anunciou a revitalização da área portuária da cidade, com a criação do Parque do Valongo, um espaço dedicado ao lazer e ao turismo. O Besnard, totalmente restaurado, será a principal atração do parque, que contará com um flutuante para recepção de turistas e um futuro roteiro de transporte público hidroviário.

A primeira fase do Parque do Valongo, com a presença do Prof. W. Besnard, será inaugurada em 30 de julho, marcando o renascimento do icônico navio oceanográfico.

Um Futuro Repleto de Possibilidades

A transformação do Besnard em um museu abre um leque de possibilidades para a preservação da memória da oceanografia brasileira e a difusão do conhecimento científico. O navio, restaurado e equipado com tecnologia moderna, poderá exibir seus 68 diários de bordo digitalizados, fotos de suas viagens, além de depoimentos de cientistas, ex-capitães e ex-tripulantes.

A criação de uma sala de aula dedicada a crianças permitirá que as novas gerações conheçam a história do Besnard, a importância da Antártica para o planeta, os desafios do aquecimento global e a tradição náutica brasileira. O museu do Prof. W. Besnard será um espaço de aprendizado, inspiração e celebração da ciência e da história marítima do Brasil.

Hoje, o Prof. W. Besnard espelha não somente a história de glórias passadas, mas também um futuro promissor como museu educacional. Apesar das adversidades, a transformação em curso é um testemunho do compromisso com a preservação da nossa herança científica e marítima. Ainda há desafios, como o financiamento de suas reformas, mas a trajetória do Besnard até esta fase já inspira uma nova narrativa sobre como podemos resgatar e valorizar nossos patrimônios históricos e científicos.

E toda a Baixada Santista agradece.

*José Manoel Ferreira Gonçalves é jornalista, cientista político, engenheiro, escritor e advogado. É presidente da Associação Guarujá Viva, AGUAVIVA, e da Frente Nacional pela Volta das Ferrovias, Ferrofrente. Idealizador do Portal SOS PLANETA.

Fontes de dados:
Site do Instituto Oceanográfico da USP
Reportagens de jornais e revistas sobre o Prof. W. Besnard
Entrevista com Fernando Liberalli, fundador do Instituto do Mar
Site da Prefeitura de Santos

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